Diz a lenda que Mãe Catirina - uma escrava que trabalhava junto com o marido numa grande fazenda - estava grávida e com desejo de comer língua de boi. Mas não de qualquer boi: a escrava queria comer a língua do novilho mais querido do patrão.
No credo popular, quando um desejo de uma mulher grávida não é atendido, o bebê pode morrer ou nascer deficiente e, por isso, Pai Francisco, mesmo sabendo do enorme risco que corria, resolve atender ao pedido da esposa e corta a língua do boi.
Quando o fazendeiro sente a falta do animal, que era o seu boi preferido, ele exige que todos os funcionários da fazendo saiam para procurá-lo. O boi é encontrado quase morto no pasto e os vaqueiros apontam Pai Francisco como culpado. O amo manda capturar o negro fugitivo e ameaça a sua vida.
Só que, desesperado para salvar a vida do boi, o dono da fazenda deixa o escravo de lado por um tempo e convoca médicos para salvar o animal primeiro. Nenhum deles consegue reverter a situação e o boi vai ficando cada vez mais fraco.
Aparecem então na fazenda uns curandeiros (ou pajés) da floresta e, com seus feitiços, conseguem salvar a vida do boi. Em algumas versões, a lenda diz que o boi já estava morto quando os pajés chegaram e que ele foi ressuscitado depois do ritual.
De qualquer maneira, o patrão fica tão feliz que resolve poupar a vida do escravo. Com o homem e boi salvos, a comunidade celebra, promovendo uma grande festa.
O auto do boi acontece de formas similares (apesar de ter nomes diferentes) em muitas regiões do Brasil, sempre como parte das festas juninas e, especialmente, em homenagem a São João.
Apesar de que a lenda representada aqui faz referência ao período colonial brasileiro - período de escravidão e de criação extensiva de gado - ela é derivada de um antigo costume pagão de sacrificar um animal no dia do solstício de verão, que, no hemisfério norte, coincide com o dia de São João.
No Brasil, o sacrifício do boi é imaginário (e não real como acontecia antigamente na Europa) e a festa que se organiza tem o objetivo de celebrar o milagre e a vida.