As celebrações do Divino Espírito Santo foram introduzidas na Amazônia pelos missionários jesuítas, provavelmente no final do século XVII ou começo do século XVIII.
O principal objetivo dos catequistas era fazer com que os povos indígenas assimilassem valores da cultura europeia e, em especial, da religião católica. As celebrações aconteciam em várias vilas e, basicamente, consistiam em uma procissão - na qual era conduzido o Çairé - seguida de uma reza e um jantar festivo.
O nome Çairé refere-se ao arco que é carregado durante a Festa. Ele lembra um escudo português - tem um formato arqueado, quase um semicírculo - e é feito de cipó torcido, enfeitado com fitas e flores. A estrutura representa a Arca de Noé e as fitas e flores coloridas simbolizam a fartura de alimentos existentes na arca e, claro, na Amazônia.
O Çairé é ornamentado com 3 cruzes centrais que representam cada uma das pessoas da Santíssima Trindade (Deus Pai, Deus Filho e Deus Espírito Santo) e com uma cruz no topo do arco, que representa Santíssima Trindade reunida em um só Deus.
O nome da Festa é cheio de controvérsias:
A primeira delas é em relação à origem da palavra: algumas pessoas alegam que a palavra çairé deriva das palavras “çai” e “eré”, que significam algo como "Salve! Tu o dizes", uma saudação de origem tupi. Outras pessoas afirmam que a origem pode estar relacionada à palavra Cairé, que é a lua cheia, tida como divindade na mitologia dos indígenas do Brasil.
A outra controvérsia é relacionada à grafia dessa palavra: em alguns lugares vê-se escrito Sairé e, em outros, Çairé. Em português, não existem palavras iniciadas com “ç”, então, a grafia aceita seria “Sairé”, mas em algumas linguagens indígenas, como o tupi, por exemplo, a grafia com “ç” poderia ser aceita.
Na região do Pará, no entanto, os indígenas não falavam tupi. A linguagem de comunicação entre eles e os jesuítas (300 anos atrás) era o “Nheengatu”. Essa língua possui apenas 19 fonemas e o “ç” não é um deles. Dessa forma a grafia “Çairé” também não existiria no idioma nativo. No entanto, na década de 1990, como uma estratégia de marketing, a cidade adotou a grafia "Çairé", reforçando a concepção local da origem e da identidade indígena e amazônica.
Apesar da festa existir há cerca de 300 anos, o Çairé deixou de acontecer por um período de 30 anos, no meio do século XX. Em 1943, os padres norte-americanos que atuavam na região, proibiram a festividade, porque consideraram que ela tinha mais atividades profanas do que religiosas.
A "proibição" dessa festa não é um fato isolado: nos anos 1930 e 1940, a Igreja Católica estabeleceu limites rígidos em relação às festas de santo que ocorriam em todo o país e várias celebrações consideradas do “catolicismo popular” foram proibidas de acontecer.
Mas depois de 30 anos, em 1973, os moradores da vila de Alter do Chão resolveram resgatar o evento como uma manifestação folclórica, desvinculada da igreja católica e do objetivo de catequese.
Atualmente, a festa dura 5 dias e acontece sempre no mês de setembro.
A abertura é numa quinta-feira, quando acontece o levantamento dos mastros (que foram retirados da mata no sábado anterior).
Os troncos de madeira são colocados na Praça do Çairé e adornados com frutas regionais. De quinta até domingo acontecem rezas, rituais religiosos e comidas comunitárias. No sábado, a atração principal é a disputa dos Botos Tucuxí e Cor-de-Rosa e, no último dia, sempre uma segunda-feira, ocorrem a derrubada dos mastros e a festa dos barraqueiros.
A festa tem vários personagens importantes:
O Capitão comanda a procissão do Çairé (como se estivesse comandando a Arca de Noé).
Os Alferes carregam as bandeiras - a vermelha do juiz e, a branca, da juíza.
O Juiz e a Juíza são os organizadores da festa. Cada um assume a responsabilidade por um dos mastros levantados durante o evento. A juíza conduz ainda a coroa do Divino Espírito Santo.
O procurador e a procuradora são substitutos imediatos para o juiz e a juíza e seus principais ajudantes.
A troneira é a pessoa que prepara o espaço onde será guardada a coroa do Divino Espírito Santo. Na chegada da procissão à praça do Çairé, a troneira recebe a coroa das mãos da juíza e guarda o símbolo durante os dias de festa.
A saraipora é a mulher que conduz o símbolo do Çairé durante as procissões.
As moças das fitas são as ajudantes da saraipora.
Os mordomos e mordomas ajudam a carregar os mastros e levam varinhas enfeitadas com fitas.
Os rufadores são os membros do conjunto musical Espanta Cão que acompanham a procissão tocando tambores e cantando hinos.
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